segunda-feira, 10 de outubro de 2022

Mike Shaughnessy - Joel Kovel, um gigante do ecossocialismo

Joel Kovel, de óculos à direita, em 2010. Foto de Ellen Davidson.

Mike Shaughnessy

30 de abril de 2021
(original aqui)

Joel Kovel morreu em Nova Iorque em 30 de abril de 2018, aos 81 anos. Foi psiquiatra, acadêmico, escritor e ativisita político, mas será mais lembrado como um dos mais influentes pensadores ecossocialistas da contemporaneidade. Em 2001 escreveu, com Michel Löwy, o primeiro manifesto ecossocialista, um brado pelo fim do sistema capitalista e sua substituição pelo ecossocialismo, antes que o capitalismo destruísse o planeta.

Seu livro "The Enemy of Nature", publicado pela primeira vez em 2002 e com segunda edição em 2007, é leitura obrigatória para socialistas, ecologistas e todos aqueles preocupados com a degradação ambiental. Foi esse livro em particular que despertou minha atenção para Joel em 2004. Sua argumentação brilhante expõe a responsabilidade pelas mazelas ambientais como decorrentes do sistema mundial de crescimento infinito, o capitalismo. 

Eu sempre me considerei socialista, mas no início dos anos 2000 estava me tornando cada vez mais preocupado com os problemas ambientais, sobretudo a mudança climática. Kovel faz uma crítica do capitalismo tanto sob o ângulo vermelho quanto verde, de uma forma que nunca vi apesar de tanto que já foi dito a respeito.

Kovel editou um revista ecossocialista pioneira, "Capitalism Nature Socialism", em parceira com outro importante ecossocialista dos anos 80, James 'Connor. Escreveu livros como "White Racism", "Red Hunting in the Promised Land" e "Overcoming Zionism".

Um ponto interessante de "The Enemy of Nature" é o uso do termo "usufruto", teorizado por Karl Marx no terceiro volume de "O Capital". A palavra vem do latim, retrocede ao Império Romano e faz parte da lei de muitos países. Refere-se ao direito legal à utilização de propriedade alheia, desde que a propriedade não seja danificada. Kovel destaca o uso da palavra em Marx ao citar que "os seres humanos não são mais do que usufrutuários do planeta e, como boni patres familias, devem transmiti-lo para as gerações seguintes em melhores condições". Kovel explica que na sociedade ecossocialista "todos terão (...) direito de uso sobre os meios de produção necessários para a manifestação da criatividade humana". 

Ele tentou sem êxito a disputa ao Senado norte-americano por Nova Iorque em 1998, e também a indicação do Green Party para a eleição presidencial em 2000, sendo derrotado por Ralph Nader. Comentou na ocasião que se recebesse um dólar de cada membro do GP que dizia gostar de suas ideias em troca de renunciar ao rótulo de socialista, ele ficaria rico. Para ele, Nader era um populista que nada entendia da temática ecológica.

Kovell se afastou de Murray Bookchin, o anarquista fundador da Ecologia Social, e eu não sei o porquê haja vista que suas ideias eram muito similares. É uma pena, mas em todo caso ambos desenvolveram o pensamento que liga as explorações social e ecológica ao sistema capitalista. Para mim, a ecologia social e o ecossocialismo são basicamente a mesma ideologia.

Tive o prazer de encontrar Joel em Londres quando ele palestrou na London School of Economics em 2007, para falar de ecossocialismo e divulgar a segunda edição de "The Enemy of Nature". Eu estava no pequeno grupo que foi com ele a um pub após o evento, e ele se mostrou uma figura encantadora e interessante. Kovel planejava retornar a Londres, mas no final já não tinha condições para isso.

Apesar da iminente crise ecológica e do "campo de força" — para usar sua expressão — do capitalismo global, ele permaneceu esperançoso, e até mesmo animado, com a perspectiva de acabar com o domínio do capital sobre a humanidade. No posfácio de "The Enemy of Nature", Kovel escreve que, quando lhe perguntavam por que não se desesperava com a crise ecológica e todo o poder do capital, respondia que não se desesperava; ao contrário, estudou a crise e concebeu as ideias que colocou no trabalho.

Kovel acreditava que se sua lógica estivesse equivocada e o capitalismo se reformasse para se tornar ecoamigável, tudo ficaria bem então. Mas se, ao contrário, ele estiver certo, sua argumentação oferece esperança para superação do sistema e da crise. Esse entendimento em si é emancipador, porque nos ajuda a adotar uma posição mais ativa ao invés de passivamente aceitarmos o ponto de vista do sistema dominante. 

Eu penso que isso tudo resume o legado de Joel, um gigante do pensamento ecossocialista cuja falta sentimos profundamente.
   

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